Ansiedade, angústia, medo, dificuldade de respirar. Esses foram alguns dos sentimentos encontrados pelo grupo de voluntários da área da saúde que esteve na Serra do Amolar, na região do Pantanal, entre os dias 28 e 31 de outubro em uma missão voluntária organizada pelo Instituto do Homem Pantaneiro (IHP). Quem trouxe detalhes muito peculiares deste atendimento foi a psicóloga Daicy Saldanha. Ela esteve ao vivo na manhã desta quarta-feira (6) no programa Rádio Livre, da FM Educativa 104,7.
“Me candidatei a vaga e de um dia para o outro a gente se organizou e conseguiu ir”, contou durante a entrevista. “Na minha percepção, a saúde física e mental estão completamente interligadas. Ninguém adoece fisicamente se emocionalmente não estiver fragilizado”, enfatizou.
A logística para o deslocamento do grupo, que também contou com o trabalho de um médico infectologista, uma veterinária, para cuidar de animais domésticos e de uma enfermeira, contou com o apoio da empresa Amapil Táxi Aéreo, que acelerou o processo de chegada até a região, que é uma das mais afastadas do Pantanal.
Se no início do ano a seca já era uma grande preocupação para as várias comunidades ribeirinhas da região, a chegada do fogo foi crucial para crises de ansiedade, pânico e até relatos de pensamentos suicidas foram constatados.
“Eles têm um histórico de abandono, são pouco vistos, não são ouvidos. Meu trabalho lá foi de acolhimento, embora não tivesse um espaço reservado para isso”, contou. Daicy diz que esse foi um ponto negativo, já que conseguiu ouvir bem poucas pessoas. É que a psicologia não é como o atendimento médico tradicional em que o paciente é examinado e medicado, demanda muito mais tempo para uma conversa mais profunda.
Desta forma, apenas 15 pessoas foram ouvidas, mulheres em sua maioria esmagadora, já que para o homem já é culturalmente mais difícil se abrir ou falar das próprias dores. Daicy relatou que a presença de uma profissional da psicologia foi algo totalmente inédito na comunidade em que esteve. “Eles nem sabiam como era o processo, como era a conversa, o atendimento com uma psicóloga”, contou. Segundo ela foram dois dias de ação e que também aplicou técnicas integrativas como Reiki e Crânio Sacral, para relaxamento, de forma a amenizar a ansiedade, a angústia e o medo que se faz muito presente entre eles.
O fogo chegou muito perto das casas, que já têm uma estrutura muito simples. Uma distância que deve ter chegado aos 50 metros das casas. A fumaça adentrou em todas elas, mesmo com as pessoas umidificando lençóis e toalhas para impedir a ação. Todas as pessoas atendidas também apresentam algum tipo de tosse, de dificuldade para respirar e quadros de sinusite e rinite.
“Eles vivem uma carência muito grande, têm pouca assistência. São seis horas de barco do Amolar até Corumbá, que é a cidade mais próxima. Não tem acesso por terra. Cada viagem de barco custa R$ 300 por pessoa, eles não têm esse recurso”, contou.
E mesmo diante de todas essas dificuldades, a percepção é que as famílias vivem em união, se ajudando o tempo todo, já que as comunidades possuem parentescos entre si e que a ideia de deixar o Pantanal está totalmente fora dos planos. “Eles se sentem os cuidadores daquela terra, amam o lugar, valorizam demais o Pantanal”, contou.
Os atendimentos foram feitos na comunidade indígena Barra do São Lourenço e Aterro do Binega. Segundo informações do Instituto do Homem Pantaneiro a equipe classificou a situação local como emergência de saúde. Apesar do trabalho feito ter incluído a distribuição de medicamentos e cuidados que incluíram também o atendimento veterinário aos animais domésticos, ainda há a necessidade de continuação deste trabalho voluntário.
O Instituto Amigos do Coração e a Amapil Táxi Aéreo também estiveram engajados na ação. A equipe de voluntários teve o médico infectologista Percival Henrique, de Campo Grande; a técnica em enfermagem Patricia Colman Costa, de Corumbá; a médica-veterinária Iandara Schettert, também da Capital, além de Daicy e Roberto Teixeira responsável pelo apoio aos profissionais da saúde.
O Instituto Homem Pantaneiro (IHP) é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos. Fundado em 2002, em Corumbá (MS), atua na conservação e preservação do bioma Pantanal e da cultura local. Entre as atividades desenvolvidas pela instituição destacam-se a gestão de áreas protegidas, o desenvolvimento e apoio a pesquisas científicas e a promoção de diálogo entre os atores com interesse na área.
Os programas que o Instituto atua são Rede Amolar, Cabeceiras do Pantanal, Amolar Experience, Felinos Pantaneiros, Memorial do Homem Pantaneiro, Brigada Alto Pantanal e Estratégias para Conservação da Natureza. O IHP também integra o Observatório Pantanal.