Ser mãe atípica é um percurso que começa, muitas vezes, com o que parece ser um desmoronamento. No meu caso, não entendia o propósito de tamanha dor, as noites insones, as incertezas que pairavam sobre o futuro. Por muito tempo, me perguntei: “por quê?”
Mas a maternidade atípica também é um milagre — ainda que só percebamos isso no meio do caminho, quando a dor começa a se transformar em força e a vulnerabilidade se converte em gratidão. Esta semana, algo tocou profundamente meu coração e me fez enxergar ainda mais claramente o tamanho desse milagre.
Um pedido de milagre
Sigo uma arquiteta no Instagram, conhecida por seus projetos elegantes e sofisticados. Contudo, há poucos dias, seus stories revelaram um cenário muito distante do design impecável. Ela apareceu como Monique, a mãe de Maitê, uma menina de 12 anos que sofreu um AVC e está em coma. Monique estava desesperada, pedindo orações por um milagre que talvez ela nem compreenda completamente, assim como eu não compreendia na época em que me tornei mãe atípica.
AVCs pediátricos são raros, mas devastadores. De acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria, eles afetam até 13 crianças em um universo de 100 mil. Em recém-nascidos, a taxa é de 1 a cada 4.000. Dados frios que não traduzem a realidade de quem vive isso: o medo que paralisa, a sensação de impotência e a súplica por respostas.
Eu senti a dor daquela mãe de forma tão visceral que precisei enviar uma mensagem de apoio, mas a correria dos dias me afastou momentaneamente da história. Só que o destino parecia querer me lembrar da intensidade dessa jornada.
Uma madrugada de medo
Estava dormindo ao lado de Isaac, meu filho de dois anos, quando percebi que ele estava quente demais. Logo, ele começou a ter movimentos estranhos no braço, que pareciam espasmos. Meu coração gelou. Fui transportada instantaneamente para memórias dolorosas com Samuel, meu outro filho, que enfrentou convulsões.
Levantei às pressas e constatei que Isaac estava com quase 40 graus de febre e dificuldade para respirar. Já experiente em crises respiratórias, mediquei e fiz o resgate. Ele ficou bem, mas eu não conseguia mais dormir.
Passei o resto da noite observando Isaac, temendo que aqueles espasmos voltassem. E foi então que, mexendo no celular, vi novamente o relato de Monique. Maitê segue em coma e agora começa a apresentar sinais de morte cerebral. É possível que Monique receba em breve a notícia que nenhuma mãe deveria ouvir, ou, quem sabe, o milagre pelo qual ela tanto clama.
Qual é o milagre?
Ser mãe atípica é difícil, exaustivo e muitas vezes solitário, mas é também um lembrete constante do poder do amor e da resiliência humana.
Não romantizo esse papel. A maternidade é um trabalho árduo e também doloroso. Mas, ainda assim, é uma oportunidade de vivenciar o amor de formas inesperadas.
Um convite à reflexão
Hoje, dedico este artigo a Monique e peço a todas as mães que unam suas forças em oração por Maitê. Não a conheço pessoalmente, mas sei o que é ser mãe, e isso me faz entender a dor que sente. Desejo profundamente que possa viver a graça da maternidade atípica, mesmo com todos os seus desafios, porque sei que nada, absolutamente nada, se compara à dor de perder um filho.
Oro para que experimente a transformação que vivi: que a tragédia inicial se converta em força, resiliência e amor.
A dádiva da maternidade atípica
Não quero romantizar. Ser mãe atípica é desafiador, exige sacrifícios inimagináveis e nos coloca diante de nossos maiores medos. Mas, como mãe que conhece essa realidade, também posso dizer que há uma beleza única nesse percurso. Ser mãe atípica é viver cada dia como uma celebração, aprender a dar valor ao que outros consideram banal e encontrar força onde nunca imaginamos que ela existia.
Que possamos refletir ao invés de nos perguntarmos “por que eu?”, que enxerguemos a dádiva em nossas jornadas. Que sejamos gratas, mesmo nas batalhas mais difíceis, e lembremo-nos de que, se recebemos desafios tão grandes, é porque fomos escolhidas para ser a fortaleza de nossos filhos.
E, juntas, elevemos nossas orações por Maitê e Monique. Que possam experimentar o milagre — ainda que ele venha em formas que só o tempo nos ensina a compreender.